Beira do Lago

Beira do Lago

Pela névoa que se dissipava sobre o lago e o lindo sol amarelo que subia pelas águas, parecia que seria um lindo dia de primavera. Perfeito! Alicia estava sobre a passarela de madeira que ia até alguns metros sobre o lago. Uma caixinha de som estava em um canto com seu iPod azul conectado a ela, e uma música relaxante invadia o ambiente antes silencioso, enquanto a garota fazia algumas posições de yoga. Alicia adorava ver o dia nascer quando estava em casa, não era algo muito fácil de fazer vivendo nas masmorras de Hogwarts. Como ela sentia inveja das comunais que ficavam nas torres! Devia ser uma linda vista...

Sentou no chão de madeira com as pernas dobradas no que se chamava “asas de borboletas” e levantou os braços para alongar sua coluna. Fora o Quadribol, não havia outro tipo de esporte em Hogwarts, e isso a deixava um pouco sedentária, já que não gostava muito de altura. Alicia sentia falta das suas aulas de dança que agora só podia fazer escondida durante as férias com sua amiga trouxa que também só existia em segredo. Parece que seus pais esperavam que, assim que ela fosse para Hogwarts, esqueceria tudo o que vivera durante os seis anos que estudara na escola trouxa, incluindo suas paixões (música e dança) e seus amigos. Não foi bem isso que aconteceu.

Além das aulas clandestinas de ballet, Alicia continuara com as lições de piano e o clube de poesia. Sua amiga recebia seus poemas através das corujas e entregava para o professor com a desculpa que Alicia estava em um internato caro em outro país, mas não queria deixar de participar. Isso não deixava de ser verdade... Quanto ao piano, ela mantinha um em uma das inúmeras salas do mauzoléu que sua família chamava de lar, e tocava incessantemente sempre que estava em casa. Na realidade, ela só voltava para casa por causa daquele piano. Não que seus pais fossem totalmente contra instrumentos musicais, mas achavam que seu tempo deveria ser mais bem aproveitado treinando feitiços de confronto, o que ela particularmente detestava.

Esticou uma das pernas e deitou o corpo sobre ela até tocar o pé com as duas mãos. Porém, justiça seja feita. Talvez, se fosse um pouco mais talentosa com o uso de sua varinha, teria conseguido salvar Ethan naquele dia... Não, não teria conseguido. Forçou mais o corpo até sentir o músculo da coxa repuxar. Aquilo poderia ter acontecido com qualquer um. Fora um ataque infeliz que ninguém poderia ter impedido. Levantou o corpo devagar, voltando a dobrar a perna e esticando a outra, repetindo o gesto que fizera com a anterior. Ethan estava bem, tudo estava voltando ao normal e ela não tinha mais que se torturar com isso. Esticou as duas pernas e deitou o corpo para frente até que sua testa tocasse a madeira fria e suas pernas ficassem perfeitamente em paralelo uma com a outra.

Sua professora de ballet sentiria vergonha se visse como ela estava enferrujada. Com os inúmeros casais que se formavam, estava cada vez mais difícil encontrar a comunal vazia de madrugada para treinar, e ela ainda tinha que decorar a última parte da sua coreografia para a apresentação de Natal que participaria em sua antiga escola. Vai ser legal rever seus amigos e poder dançar novamente naquele palco... Levantou o tronco, juntou as pernas e deu um impulso para ficar de pé.

O tênis dificultava um pouco, mas conseguiu ficar nas pontas dos dedos e esticar uma das pernas até perto do rosto, apesar da roupa nada adequada para a dança. Dobrou a perna antes esticada e deu uma pirueta perfeita, mantendo os olhos fixos no reflexo do Sol no lago, que agora já iluminava tudo. Alicia achou que seria uma boa escolha um short jeans e uma blusa leve de alças em contraste com o uniforme pesado que usava o ano todo. Viver nas masmorras a deixara ainda mais pálida do que o normal e uma dose de vitamina D cairia bem. A música relaxante já havia mudado para a música que ela teria que apresentar no recital de Natal e Alicia se deixou levar pela coreografia que já trazia gravada na cabeça. Dançando, sentindo a brisa do lago e o Sol refletindo em sua pele. Era como estar em casa.

Observava de longe os movimentos que fazia a sonserina na beira do pier. Cada posição meticulosamente calculada e a mesma parecia esbanjar todo o entendimento naquela especie de alongamento matinal. Resolvendo não interrompê-la, Ethan escorou o corpo na árvore mais próxima ao lago, deixando as varas de pé ao seu lado enquanto cruzava os braços contra o peito admirando a vista, não só da paisagem e o sol que lentamente surgia no horizonte, mas de Alicia e toda a sua graciosidade. Dali conseguia ouvir a melodia suave sem letra que inspirava a bruxa em seus movimentos que logo se tornavam passos de uma dança planejada. O garoto sorria com a cena, não por achar graça, mas em admiração. Ela era afinal muito mais do que prometia. Era conteúdo além de um rostinho bonito e não o admirava que tivessem uma amizade tão forte antes de perder sua memória, a ponto dela insistir em fazê-lo relembrar ou sequer se esforçar em reconstruir o que já tiveram um dia.

Conforme a melodia ia dando indícios de chegar ao fim, os movimentos de Alicia diminuíam gradativamente acompanhando o som numa sincronia exemplar. Nisso, Eth se sentia confortável para aproxima-se. — Isso foi bem legal! — Dizia ao se juntar, esperando pela reação sem jeito de Alicia e acertara em cheio que ficaria. Sorriu com a situação. — Bom dia, moça! Conseguiu dormir bem? — Indagou descontraído tentando dissipar qualquer suposta tensão pelo flagra. — Eu apaguei ontem a noite depois que voltei pra barraca.. — Mentiu, já que fora dormir tão tarde pensando em todos os acontecimentos que o levou até ali e quando finalmente conseguiu pegar no sono, fora atormentado por sonhos ruins. Apesar de não recordar bem o que exatamente o apavorou durante a madrugada, tinha certeza que não era nada parecido com os sonhos de rotina.

— Estou adorando cada vez mais esses seus artefatos trouxas. Fico até curioso com a próxima coisa que vai me mostrar. — Confessou de maneira divertida referindo-se ao aparelho que emitia o som de maneira mais alta que o aparelho apresentado a ele na noite anterior. Reparando que a garota já se mostrava confortável o suficiente, resolveu perguntar. — E essa dança? Você faz parecer tão fácil.. Faz parte do outro mundo ao qual pertenceu? — Aproximava-se mais da beira do Pier, onde deixou as duas varas que trouxera consigo no canto direito e sentou-se dando espaço no lado esquerdo para que Alicia fizesse o mesmo. Tirou então a mochila das costas largando-a atras de si, os sapatos, deixando-os do lado das varas e dobrando a bainha da calça, para consecutivamente enfiar os pés na água de maneira que ficasse totalmente confortável. O frio na água não parecia incomoda-lo.

Conforme os acordes da música foram ficando mais baixos, Alicia flexionava o corpo em uma reverência tradicional ao fim desse tipo de dança, recuperando um pouco do fôlego. As pessoas costumavam subestimar o ballet, mas era bem verdade que as bailarinas eram verdadeiras atletas, sustentando o próprio peso somente nas pontas dos dedos e tendo que controlar minuciosamente cada músculo do corpo para realizar com perfeição cada pose. Não era algo fácil, nem algo que se aprendia do dia para a noite. Sem contar as horas e horas de prática necessárias para adquirir a tal perfeição tão almejada. Por isso, Alicia não era tão fraca quanto parecia, apesar da estatura baixa e da estrutura óssea fina, o que a dava uma aparência frágil. Só aparência.

Deu um pulo ao ouvir uma voz atrás de si que, apesar de conhecida, fazia seu coração palpitar há dois anos sempre que era ouvida. Foi pega por um pouco de timidez ao ver que Ethan a observara durante seu treino e se perguntou o quanto será que ele tinha visto, mas achou melhor não estender muito aquele assunto para não continuar falando sobre a dança. Quanto mais rápido sumisse com aquele tom rubro das bochechas, mais rápido conseguiria voltar a agir normalmente. – Bom dia! – Abriu um sorriso, enquanto ajeitava o cabelo em um rabo de cavalo desajeitado que deixava alguns fios caídos pelos lados do rosto. – Até que sim, tirando o fato da minha colega de beliche roncar que nem um trasgo. – Revirou os olhos e agachou ao lado de sua bolsa para pegar uma garrafa de água. Diante da sede que estava, parecia que não bebia água há séculos.

Não conseguiu evitar de rir diante do comentário de Ethan sobre seus eletrônicos e, realmente, para quem vivera no mundo bruxo durante toda a vida, como ela sabia ser o caso do sonserino, esses artefatos trouxas poderiam mesmo parecer algo extraordinário. Porém, para ela, era só uma caixinha de som que nem era tão avançada assim. Imagina se ele soubesse o que um smartphone podia fazer! – Receio não ter nada mais interessante do que música. – Ela sorriu consigo mesma e, portando sua garrafa, caminhou até o encontro do garoto que se preparava para sentar com os pés na água. Levando em conta o horário e o fato da água do lago ser corrente, devia estar um gelo ali, então, Alicia se conteve em sentar ao lado dele com as pernas cruzadas. Frio não era muito o seu lance.

- Se chama ballet e tenha a certeza que é tudo menos fácil. – Sorriu convencida. – E sim, eu aprendi na minha outra escola. – Alicia deixou seu olhar vagar pelas águas do rio, mas não era isso que ela enxergava. Em sua cabeça, várias e várias cenas rodavam em um flashback de aulas, apresentações e tudo o que ela vivera naquele estúdio de dança. Conhecera sua melhor amiga trouxa ali. Pouquíssimas coisas a faziam tão feliz, quanto estar naquele palco. Estar com Ethan era uma delas. – Eu me inscrevi em um curso de verão para continuar tendo aulas e vai ter uma apresentação... – Abaixou os olhos, mas voltou a encarar o garoto em seguida.

Ele já sabia disso, como de todo o resto. Até já a ajudara a ensaiar aquela mesma coreografia quando eles voltaram das férias. Antes do... Alicia sacudiu quase que imperceptivelmente a cabeça e voltou a abrir um sorriso. – Então, pescaria! – Exclamou animada. – O que você sabe sobre essa tão nobre arte e como vai fazer para que não sejamos devorados ou acabemos congelados dentro desse lago? Já pensou no fato que podem ter criaturas maiores do que a gente vivendo ali embaixo? – Encarou o lago, meio receosa, e voltou a olhar para Ethan com uma expressão engraçada de quem está animado, mas com medo ao mesmo tempo, se é que existe esse tipo de expressão. Um medo corajoso, podemos dizer.

Reparava pela visão periférica o ofegar da amiga e a fina camada de suor que cobria sua pele, especificamente na região do busto que a mesma fizera questão ou não de deixar calculadamente a mostra em um decote pouco comportado. Podia ver também a transparência da blusa que semi-revelava o top preto por baixo da mesma, ou talvez fosse um sutiã. Não tinha certeza já que poucas foram as vezes que vira aquela peça mais intima e não sabia diferencia-los. A cena do episódio solo na barraca viera atropelando seus pensamentos e aquilo agitou o sonserino que rapidamente tentou afastar os pensamentos obscenos da mente. — Apresentação? — Indagou aproveitando o assunto que o faria esquecer, voltando seu foco de olhar somente no azul dos olhos de Alicia. — Não consigo imaginar como poderia ser isso. O que quer dizer que você vai dançar pra um monte de pessoas? Tipo exatamente como fez aqui? Coragem, viu?! — Dizia num tom de real admiração.

— Bom, eu pensei que poderíamos pescar daqui mesmo do pier, o que seria mais conveniente e nos daria mais conforto também. Mas depois calculei melhor e, dane-se o conforto. Conforto pra que? Estamos acampando afinal. — Mencionou dando de ombros com um pequeno e sugestivo sorriso marcando sua face. — E o fato da existência de criaturas sob essa água negra só torna as coisas ainda mais divertidas. Você não confia em mim? — Indagou fingindo um leve desapontamento, e logo retomou ao seu raciocínio. — Bom, convenhamos que não vamos a lugar algum sem um barco.. Por isso ainda estamos aqui. James tem um amigo que conhece alguém que pode nos arrumar o barco. Mas, o preguiçoso ainda estava dormindo quando vim te encontrar, então, vamos esperar até que ele chegue com a nossa carona. — Concluiu. Virando o rosto em direção ao sol que estava cada vez mais alto e consequentemente também mais quente.

Os raios da luz natural tocavam sua pele quase como uma massagem relaxante e Ethan adorava a sensação. Arrependeu-se por não ter escolhido uma bermuda em vez de calça. A garota ao seu lado estava com a vestimenta bem mais propícia ao planejamento. Bom, para relaxar ainda mais, empurrou a mochila mais pra trás e esticou as costas na madeira fazendo a mesma de travesseiro. Deu dois tapinhas no espaço ao seu lado atras da garota de forma sugestiva e esperou que o fizesse. Num breve silêncio podia ouvir o som da água, de algumas espécies de pássaros e se concentrando bem, podia ouvir também até a voz de alguns alunos destrambelhados e escandalosos. Aquilo lá eram horas para aquele tipo de quizumba? Pensou consigo desejando que a algazarra não chegasse ali pra interromper o momento dos dois.

— Sonhei com você essa noite. — Encheu o peito de coragem pra dizer aquilo, mas não coragem o suficiente pra assumir que em vez de sonho, tinha sido um pensamento totalmente lúcido planejado por ele mesmo. No caminho que fizera da barraca ao lago, vinha meditando consigo se contaria ou não aquilo para Alicia, sabendo que se fizesse, indicaria de forma inconsciente sua vontade e poderia haver uma oportunidade de conseguir o que desejava. Mas também poderia assusta-la a julgar pelo bom histórico de sua amizade. Bom, uma nova memória pedia uma nova história. Ethan não era mais a mesma pessoa pra ela assim como era impossível que ela fosse pra ele já que não se lembrava. E ao se disponibilizar a reescrever o conto dos dois recriando sua amizade, a bruxa deveria saber que estaria sujeita àquele tipo de inconveniente. Inspirou profundamente sentindo o ar puro encher seus pulmões. Expirou.

Fora um pouco pega de surpresa com a constatação de Ethan sobre o quão importante era uma apresentação daquele porte. Realmente, seria um espetáculo enorme. Muitos dançarinos, muitos figurinos, muitos espectadores... Pela primeira vez, Alicia se sentiu ansiosa, mas a sensação foi lentamente se dissipando, conforme Ethan começou a falar sobre seus planos para a pescaria. – Um barco? – Exclamou surpresa. Ela não se lembrava se algum dia havia andado de barco. Provavelmente, não. – É claro que eu confio, mas você acha que um barco é mesmo uma boa ideia? – Olhou novamente para as águas escuras do lago que, mesmo iluminado pelo Sol, era impossível saber sua profundidade. – Bom, eu vou, mas fique atento porque eu não nado muito bem. – Concluiu resoluta e se deitou ao lado dele.

Como era bom tomar um bom banho de Sol assim... Ainda era cedo demais para estar muito quente, porém, tarde o bastante para que surtisse um bom efeito. Alicia fechou os olhos e se permitiu aproveitar a sensação. E foi aí que ela realmente caiu em si de que estava deitada ao lado de Ethan. Claro que já estivera nessa situação inúmeras vezes. Fosse nos jardins de Hogwarts em dias de Sol como aquele ou esparramada no colo dele no salão comunal nos dias mais frios. Talvez tenha sido por isso que deitou ali de forma tão natural sem nem pensar duas vezes. Porém, agora que estava ali, o calor do corpo dele tão próximo a queimava mais do que o Sol poderia fazer no horário mais quente do dia.

“Um sonho? Como assim um sonho?” Não conseguiu falar por alguns segundos que pareceram horas. Alicia conseguiu ver as nuvens passando devagar no céu, o vento soprando os fios de seus cabelos pelo rosto, seu peito subindo e descendo com sua respiração que ficava cada vez mais acelerada... – Que tipo de sonho? – Sua voz saiu baixa, não mais do que um sussurro, mas, como Ethan estava ali tão perto, era o suficiente para que ouvisse. Num impulso, virou o rosto para o lado onde o garoto se encontrava, como se ele fosse o ímã que sempre a atraísse, não importa o que acontecesse. Tão lindo, engraçado, charmoso... Não conseguiu deixar de pensar de como as coisas seriam se Ethan ainda se lembrasse de tudo. Estariam namorando? Usariam o salão comunal de madrugada para mais coisas do que ensaiar coreografias? Fugiriam para algum lugar isolado mais além do lago para se agarrarem atrás de alguma árvore? Estariam se beijando agora...?

Permitiu que o silêncio se instaurasse o que o dava tempo pra pensar no que diria a seguir. Buscava e calculava quais palavras usar de modo que não a assustasse, formando explicações em sua mente que não o revelariam como o pervertido do acampamento. Permaneceu naquela posição encarando o céu que era muito mais fácil do que falar olhando para Alicia. — Estava deitado na minha parte da beliche na barraca do acampamento, sentindo que estava perto do sono vir quando você apareceu de pé ao lado da cama sussurrando. Perguntava se tinha um espacinho ali pra você também. — Pigarreou franzindo o cenho ao dar a primeira pausa pra reorganizar melhor suas palavras e continuou olhando o céu.

As nuvens viajavam lentamente a noroeste, hora cobrindo o sol, hora revelando-o. Ethan então tomou coragem e voltou a contar. — Cheguei pro lado abrindo espaço pra você, e logo estava lá dividindo não só o pequeno espaço da cama, mas também o meu lençol. Devo ter esquecido de mencionar que vestia uma camisola sensual de mais pra quem estava acampando. Preta e curta. E me desculpe por isso, mas eu não mando em meus sonhos; me aproveitei da situação, não pude evitar. Você tava lá toda cheirosa, vestida daquele jeito e ainda por cima me fez ficar de conchinha. Como pôde? — Agora resmungava mais para si mesmo fingindo indignação pra aliviar o seu lado. Não conseguia olhar pro lado e sua visão periférica não estava funcionando muito bem naquele ângulo, por isso não sabia como era a expressão da garota naquele momento. então resolvera fechar os olhos, assim ficaria mais fácil dizer em voz alta.

— Acariciei seu corpo iniciando pela perna, deslizando mais pra cima, passando pelo quadril e depois cintura por baixo da camisola que subia a medida minha mão avançava cada vez mais.. Você simplesmente deixou, como se estivesse gostando. Logo eu estava beijando seu pescoço e.. — Parou repentinamente sentindo o familiar formigamento sob sua calça e não estava na melhor posição para aquele tipo de incidente. ''DROGA!'' Sentou-se rapidamente tentando disfarçar o volume inconveniente, ficando na posição das pernas de borboleta. — Você ouviu isso? — Perguntou mentiroso, não tendo escutado nada de fato. Mesmo assim reforçou o teatro. — Estou certo de que ouvi algo.. — Olhava pras árvores atras deles ganhando tempo para acalmar seus ânimos.

Ethan permaneceu em silêncio pelo o que pareceu uma eternidade. Ele não a olhava e isso fez Alicia ficar tensa e sentir sua respiração ofegar cada vez mais. Cada segundo parecia uma hora inteira no total silêncio. Pensou em desviar os olhos também, mas não conseguia se mexer. Estava paralisada pela ansiedade e pelo medo. O que ele sonhara para ser tão difícil contar para ela? Será que estava começando a se lembrar de alguma coisa? E se não foi um sonho, mas sim, um flash de memória...? Finalmente, quando suas mãos já tremiam e ela estava prestes a perguntar pela segunda vez, a voz do garoto pareceu ecoar pelo píer, tamanho era o silêncio ao redor deles. Até o vento pareceu parar para escutar melhor.

Alicia franziu o cenho e se sentiu um pouco confusa, de início. Nunca estiveram ali antes e, definitivamente, ela nunca pedira para subir em uma beliche, portanto, não era uma memória. Então, o que, por Merlim, poderia significar esse sonho? Conforme o sonserino avançava em seu relato, ela começou a entender. Seu rosto começou a esquentar e a simples menção a uma camisola sensual fez Alicia pensar seriamente em pular naquele lago. Nunca se vira como alguém nem remotamente sensual e, por mais que Ethan havia se declarado no passado, nem chegara a pensar que ele poderia manter aqueles tipos de pensamentos sobre ela. Muito menos agora que ele estava desmemoriado.

Por mais que ele parecesse constrangido com o sonho, não parou de contar. Era um misto de sentimentos. Por um lado, ela estava envergonhada e não queria saber os detalhes, mas, por outro... Como seria a sensação das mãos dele em sua pele daquele jeito? Ele disse que, no sonho, ela estava gostando... Será que ela gostaria mesmo? Claro que gostaria... Alicia sentiu seu corpo esquentar ainda mais conforme o relato seguia. Era como se ela conseguisse sentir em seu próprio corpo cada palavra de Ethan, principalmente nas áreas abaixo da cintura, que eram onde, segundo ele, as mãos dele começaram ao subir a camisola. Discretamente, ela roçou uma perna na outra, fingindo se ajeitar em uma posição mais confortável, mas não saberia até quando conseguiria disfarçar com a respiração ofegante daquele jeito e o tremor se espalhando por áreas que não era comum tremerem.

Foi quando, repentinamente, Ethan voltou a sentar, alegando que estava ouvindo algo. Alicia quase gritou de susto, sentando também, em um ímpeto, e olhou ao redor, assustada. Passou as mãos pelos cabelos, fingindo arrumar os fios soltos, mas mais fios caíam pelo seu rosto porque ela não tinha ideia do que estava fazendo. “Por Merlim, que calor é esse?” Por sorte, a garrafa de água ainda estava ali, e ela tomou cinco goles seguidos, engasgando um pouco devido à respiração acelerada. – Eu não ouvi nada, mas seu amigo deve estar chegando, não é? – Ela levantou um pouco sem jeito, apertando aquela garrafa na mão sem nenhum motivo aparente. Mas, por dentro, tentava controlar uma vontade enlouquecedora de pular em cima de Ethan ali mesmo e realizar aquele sonho. “Calma, Alicia! Você não é assim!”

O fato de seus shorts serem tão curtos e a sensação de que Ethan estava admirando isso naquele exato momento, sentado ali, enquanto ela pairava de pé ao lado dele, a deixava estranhamente mais excitada. – Olha! – Praticamente gritou, apontando para o lago, para onde parecia estar vindo um barco na direção deles. – Parece que o seu amigo resolveu aparecer. – Respirou fundo em uma tentativa de se acalmar e aparentar normalidade. – Ele vai com a gente? – Indagou Ethan, franzindo as sobrancelhas. Não que tivesse algo contra o amigo dele, mas não era assim que esperava que seria o dia. Porém, com o amigo presente, eles não correriam risco de fazer nada reprovável. “Mas isso é bom ou ruim?” Pensou consigo mesma, reparando, pela primeira vez, que Ethan também parecia ter ficado tão animado quanto ela com o tal sonho. “Oh, Merlim...”

O garoto estreitou os olhos fixando-os nas arvores ao identificar a silhueta de James saindo dentre os arbustos e de fato trazia consigo um barco de tamanho satisfatório, mas apenas para dois. Três ali ficaria apertado de mais. Já pensou em usar aquele argumento caso o amigo se oferecesse pra participar daquela suposta aventura conforme Alicia indagou. O sonserino então desviava seu olhar do ponto em que o amigo aparecera para as pernas expostas de Alicia, pouco conseguindo disfarçar. Insistiu voltando o olhar pra James que se aproximava e ao mesmo tempo se colocou de pé. — Até achei que você não vinha mais. Foi muito difícil conseguir? — Perguntou se referindo ao barco que o mesmo trouxera consigo em levitação e já o colocara na água tendo acesso bem ali na beira do pier.

Revirava os olhos ouvindo pelo que seriam cinco minutos o amigo se gabar de sua competência em conseguir tudo o que precisasse. Só não conseguia mesmo era calar a boca ou perceber que estava sendo inconveniente. — Tudo bem, a gente já entendeu que você é o cara! — Resmunou em resposta dando a deixa que James precisava para voltar pelo mesmo lugar que o levou até ali, e entendendo aquele olhar e o discreto código entre amigos, o garoto apressou-se em inventar qualquer coisa pra fazer no acampamento, se retirando dali em seguida. Ethan sorria aliviado voltando-se para Alicia.

— Acho que a nossa carona está pronta. — Indicou o barco flutuando inteiramente para eles, levemente agradecido pela interrupção de James num tempo perfeito. Prontamente apanhou as varas esquecidas no chão do pier, sua mochila e também a mochila da garota. Desceu com cuidado para não virar o barco despejando suas coisas ali dentro, em seguida apanhou também a caixa de som não deixando nenhuma outra coisa para trás. Encarou Alicia com a face iluminada em expectativa, estendendo-lhe a mão para que a mesma embarcasse com ele. — Então, confia em mim ou não? — insistiu esboçando aquele sorriso de canto que geralmente usava pra convencer alguém.

Assim que conseguiu convencê-la, esperou que se sentasse e percebendo já estar em segurança, pegou um dos remos que usou para empurrar contra o pier afastando-os dali lentamente mais pro meio do lago. logo, sentou-se também de frente para garota mantendo aquele mesmo sorriso, não porque quisesse convencê-la de algo, mas porque estupidamente não conseguia ''desafrouxar os parafusos'' de seu rosto que mantinham aquela expressão. — Está com fome? — Perguntou preocupado que Alicia não tivesse comido nada antes de encontra-lo e talvez demorassem um pouco ali.

Alicia observou James, enquanto o garoto levitava o barco até eles, levemente impressionada por ele conseguir manter aquele feitiço por tanto tempo com um objeto tão pesado. James era o tradicional palhaço da turma, amigável, meio bobo, mas até que útil de se ter por perto. Porém, nunca o vira como alguém hábil com feitiços. Coisa esta que nunca teria conseguido perceber caso Ethan não tivesse perdido a memória e se aproximado dele. Alicia estava em uma fase em que tentava ver as coisas positivas por trás do ataque para não sentir mais aquela dor que sentiu por tanto tempo e que parecia ficar cada vez menor conforme os dias passavam.

Esperou que os garotos terminassem seu “papinho de meninos” que consistia em se gabar das coisas e fazer alguns comentários inconvenientes, o de praxe. Preferiu se manter ali em silêncio com sua garrafa de água na mão, só sorrindo e acenando, até que o outro sonserino percebeu que estava sobrando e seguiu seu caminho de volta para o acampamento, mas não sem antes lançar vários sorrisos maliciosos e conspiratórios para Ethan, que fingia não saber o que ele estava insinuando. “Garotos”.

Manteve-se na mesma posição enquanto Ethan colocava tudo no barco, só observando, desconfiada. Será que aquilo era mesmo uma boa ideia? Boiar em uma coisa frágil daquelas em um lago desconhecido que eles nem sabiam quais criaturas poderia abrigar. Sabia que viviam sereianos no Lago Negro... E eles não eram nada amigáveis. Engoliu em seco ao encarar a mão de Ethan estendida para ela, junto com aquele sorriso sedutor irresistível. Entrar naquele barco minúsculo com o amor da sua vida e viver o que parecia ser um dia perfeito junto com ele rumo a morte ou voltar para o acampamento e se contentar com os milhares de pensamentos maliciosos que rondavam sua cabeça? Ela soltou um suspiro pesado e segurou a mão dele, entrando no barco. - Se eu morrer e for obrigada a assombrar esse lago para sempre, eu te mato e te obrigo a ficar aqui comigo. – Sentou em um dos dois espaços disponíveis no barco, olhando ao redor, apreensiva.

Só então notou o quanto estava faminta, já que ainda estava em jejum. Não ajudava na leveza do corpo estar de estômago cheio. – Muita. – Respondeu, cruzando os braços sobre a área da barriga. – Eu trouxe uma maçã... – Buscou sua bolsa com o olhar. – É que eu tenho que controlar o peso para a apresentação... – Fez uma careta, sabendo que a maçã não seria nada perto da sua fome, e nem tão saborosa quanto algo, digamos, com mais sustância. – Mas eu confesso que não consigo parar de pensar em comida! – Cobriu o rosto com as mãos, como se estivesse envergonhada, e começou a rir. – Devo ter sido lufana em outra vida, só pode! Sabia que a comunal deles é do lado da cozinha? Devem comer o tempo todo... – Percebeu que estava divagando e se forçou a retomar o controle do assunto, voltando sua atenção para Ethan. – Desculpa, isso não tem nada a ver com o assunto. Enfim, me diga, por favor, que tem algo muito melhor do que uma maçã na sua mochila. – O encarou com uma expressão de súplica.

O bruxo ainda ria do comentário de Alicia sobre sua morte iminente e um possível assombro quando a mesma emendava comentário após comentário sobre os lufanos e a localização de sua comunal. Não entendeu bem o porquê toda aquela tagarelice e pensou que tivesse relacionado ao assunto anterior a aparição de James. Bom, até que ela estava lidando com aquilo bem melhor do que ele pensou e a maior prova era sua presença naquele barco. — Na verdade.. — Iniciou em um tom de quem se gabava. — Sim, eu tenho ingredientes para um bom sanduíche na mochila. Não sei se estão tão saborosos já que eu os peguei ontem a tarde antes de ir ajeitar as coisas pro acampamento. — Confessou mantendo a expressão enquanto remava mais pro meio do lago. Julgando a distância boa o suficiente, nem tão longe ou tão perto da margem de onde saíam, cessou o remar colocando os remos pra dentro.

Apanhou a mochila atras de si tirando lá de dentro dois pães de tamanho satisfatório, uma faquinha também malocada do castelo, uma pequena bolsa térmica que carregava o peito de peru desfiado misturado com maionese. Abriu a tampa do pote afim de sentir o cheiro do mesmo e parecia tão bom quanto no dia anterior. Com auxílio de Alicia, começaram a montar o lanche no improviso.. — Pescar que é bom ninguém quer.. — Comentou brincando ao terminar o seu. Deu então a primeira mordida e no exato momento seu estômago roncou e protesto indicando a fome que sentia sem ter percebido. — Hmmmm!! Minha nossa, não sei se ta realmente bom assim ou a minha fome que era enorme. — Mencionou com a mão cobrindo a boca que ainda terminava de mastigar sua primeira mordida.

Seu barco flutuava na calmaria do lago enquanto o casal terminava seu lanche e Ethan pensava numa forma de quebrar o silêncio, mesmo que breve, com qualquer coisa que não deixasse a garota mais sem jeito do que ele poderia ter ficado com toda a história do sonho. Nada! Só conseguia imagina-la vestindo aquela pequena camisola preta que roubara seu sono. — Acho que te devo desculpas. — Disparou repentinamente sem pensar e o olhar curioso dela sobre seu comentário o fez exitar.— Eu não queria te constranger quando contei o meu sonho.. Só achei que eramos bons amigos o suficuente a ponto de não precisar esconder nem mesmo essas coisas. Bom, é o que você sempre deixa a entender. E por um momento eu me senti a vontade como o amigo que você tanto sente falta. — Concluiu mesmo tendo calculado cada palavra de modo que tudo ficasse a seu favor.

Mais um breve silêncio e Ethan desejou retirar cada palavra proferida. Buscava no olhar de Alicia qualquer vestígio de chateação ou arrependimento por estar ali, mas não era tão bom assim em decifrar seus sentimentos, ainda mais quando estava tão nervoso. Tentou também não transparecer. — A gente pode até voltar se você preferir. Mas, eu gostaria que não.. Ainda queria tentar resolver umas coisas. — Deixava as palavras pendentes de uma melhor explicação mas precisaria primeiro da posição da amiga antes de prosseguir com seu planejado.

Quando Ethan falou sobre os tais ingredientes de sanduíche que ele trazia na mochila, Alicia apertou mais os braços ao redor da barriga para disfarçar como seu estômago roncava. “Meu Merlim, que vergonha!” A preocupação de parecer bonita e atraente para Ethan o tempo todo, a reprovava por estar daquela forma parecendo tão esfomeada. Não era uma coisa muito atraente. Ajudou o garoto com as coisas que ele tirava da mochila, apoiando em seu colo. Quando ele abriu o pote, o cheiro invadiu em cheio suas narinas e ela sentiu a boca encher de água e nem se importou com o fato que aquela maionese estava guardada em uma mochila há quase um dia inteiro. – Que ideia maravilhosa essa sua. – Comentou ao abrir seu pão com a faca e entregar para Ethan fazer o mesmo com o dele.

Nada melhor do que uma comida simples para matar a fome. Como não viu uma colher, pegou novamente a faca para passar o patê no pão e, devido à fome, nem reparou se o garoto já estava comendo o sanduíche dele ou não, já deu uma mordida no seu. Uma mordida tão grande que acabou ficando com a boca cheia de comida, sem conseguir mastigar direito, com medo de cair algum pedaço do lanche para fora. “Como você é sexy, Alicia”. Se reprovava.

Concordou com o comentário de Ethan com um aceno de cabeça e um sorriso com a boca fechada, colocando logo a mão na frente da boca para tentar mastigar aquilo mais rápido. Notou que o silêncio desfazia o clima que até então, estivera tão bom, assim como seu sanduíche começava a esmorecer devido à quantidade excessiva de patê. Conforme conseguia mastigar com mais tranquilidade, pensava em algum assunto para começar com Ethan, quando ele começou a falar. “Desculpas?” O encarou, intrigada, tentando entender onde ele queria chegar com aquilo. Alicia não estava constrangida, muito menos brava com o sonho que ele tivera. Ficara excitada, é verdade, mas não brava. A única coisa que ela reparava naquele discurso era o uso da palavra amigo duas vezes. Duas vezes.

“Isso é bom, ele está querendo mesmo retomar a amizade. Está se esforçando”. Conseguiu, finalmente, engolir a comida e pensava em dar outra mordida, mas preferiu deixar a boca livre para respondê-lo. “Mas, será que ele quer ser só meu amigo?” Sua cabeça estava confusa com tudo aquilo. Era só amizade ou ele queria algo mais? Será que seus sentimentos haviam sobrevivido à perda de memória? Ou fora só um sonho erótico de um adolescente cheio de hormônios atraído por uma garota bonita? Pelo visto, ela ficara em silêncio por tempo demais porque Ethan voltou a falar, agora com uma conversa de desistirem do passeio.

-Não, claro que não, eu não estou brava. Nós viemos pescar, nos divertir e é isso que vamos fazer e... Droga! – Exclamou quando um pouco de patê caiu sobre um de seus seios que aparecia um pouco sob o decote da blusa e começou a escorrer entre os seios. “Droga! Droga! Droga!” Uma mão estava com o sanduíche cheio de patê, e ela não via nenhum pano por perto. Então, antes que o patê derramado sujasse seu sutiã novinho, ela limpou com a outra mão, enfiando os dedos por dentro da blusa. – Desculpa. – Lambeu o dedo sujo de patê. – Que tipo de coisas você está querendo resolver?

O garoto terminava seu sanduíche quando Alicia se pronunciou em permanecer ali. Pra quem temia entrar no barco, e no lago, aquilo era um bom sinal. Pensou consigo que aquilo seria uma pista de que o sonho não a teria incomodado afinal e o novo sentimento provocou-lhe a sensação de borboletas no estômago. Ou seria o efeito imediato de um sanduíche duvidoso? Contava realmente com a primeira opção já que estariam longe o suficiente da margem pra uma indesejada dor de barriga. Mesmo assim receoso, optou em não terminar aquele restinho de pão em sua mão, reservando-o de volta no pote dentro da bolsa térmica que deixou sobre a mochila no fundo do barco.

A sonserina por sua vez, parecia confortável e deliciando o que comia. “Ufah!” Aliviou-se. E antes mesmo que pudesse acrescentar algo ao seu comentário, teve como reação a imobilidade em apenas observá-la limpando o decote sujo com a pasta de maionese e peito de peru que vazou de seu sanduíche. Cinco segundos boquiaberto com a cena era tão pouco e ao mesmo tempo representava uma eternidade se você se via num estado de transe admirando e crescendo ainda mais seus pensamentos impuros com alguém. Alicia não sabia, mas aquele gesto conseguiu tirar o bruxo de sua órbita. Como podia sua garganta estar seca daquele jeito enquanto a boca salivava tanto?! Pensou consigo então conseguindo fechar a boca e engolir um pouco de saliva.

— Você pode me arrumar um pouco daquela sua água.. por favor? — Ignorando a pergunta dela, aquela foi a primeira coisa que conseguiu dizer quase que rouco. Pigarreou tentando limpar a garganta quando se servia com três bons goles da garrafa da amiga. Percebeu naquele ato que morria de calor e em sua mente a imagem de um mergulho no lago veio a parecer ótima ideia. Com certeza a sonserina reprovaria. Fechou a garrafa devolvendo-a em seguida, tentando não ser tão descarado em olhar de mais aquele decote recém limpo de patê mesmo pensando que queria ele mesmo te-lo lambido pra limpar. Aquela altura era inútil tentar se livrar de seus pensamentos sórdidos e involuntariamente deixou-se levar por um sorriso malicioso que parecia fugir do contexto.

— Primeiro, vamos tentar iniciar a nossa pesca já que foi pra isso que a gente veio. — Iniciou a resposta que ficará devendo. — Sabe como segurar a vara? — Perguntou ao pega-las, passando uma para a garota logo em seguida providenciando a isca dos dois. Sabia que sua resposta Parecia de longe completa e conseguia identificar isso na expressão de Alicia que o assistia. Respirou fundo agradando-se com a pureza do ar que preenchia seus pulmões. — Quanto ao resto, acho que vou esperar um pouco mais pra ver como vai ficar. — Concluiu de forma misteriosa mantendo um leve ar de cinismo ao fita-la, imaginando se a mensagem subliminar poderia ter sido desvendada por ela ou permanecia uma incógnita. Afinal, aquele seu comportamento era atípico desde que a bruxa resolvera tentar trazer de volta as memórias do garoto. Não tinha certeza como era antes disso.

Alicia entregou a garrafa de água, o observando de forma curiosa e desconfiada. Ethan parecia ter sido atingido por um feitiço estuporante do nada e, agora, tomava a água como se tivesse ficado por anos perdido no deserto. Parecia com ela há alguns minutos atrás, excitada enquanto ele narrava aquele sonho... Quando ela olhou para baixo e percebeu que o decote de sua blusa estava bem mais abaixo do que estivera antes, até mostrando um pouco do sutiã preto que ela trazia por baixo, Alicia entendeu o que estava acontecendo. Seu corpo ficou ainda mais quente do que já estava desde que ouvira aquele sonho e se colocara presa com Ethan em um barco minúsculo, e uma inquietude começou a tomar conta de si.

Enquanto Ethan preparava as coisas da pescaria, Alicia se viu discutindo consigo mesma, uma outra Alicia cheia de luxúria e desejo que vivia dentro dela e estava louca para pular em cima de Ethan ali mesmo e esquecer aquela história de pescaria em pró de algo mais interessante. “Olha como os braços dele são fortes... Imagina como seria ter aqueles braços te pegando de jeito...” Seus olhos foram instantaneamente atraídos para os braços de Ethan que, apesar de ainda ser tão jovem, já ostentavam alguns músculos em desenvolvimento. “Mas eu não posso simplesmente mandar ele me pegar! O que ele vai pensar de mim...” Ajeitou uma mecha solta atrás da orelha, tentando desviar os olhos para qualquer outro lugar, mas eles insistiam em viajar pelo corpo do sonserino. Seus cabelos bagunçados do jeitinho que ela gostava, aquela boca que parecia tão macia, aquele peitoral que ela queria tanto passar as mãos... “Não interessa o que ele vai pensar de você. Só interessa o que ele vai fazer com você...” – O quê?! – Exclamou, arregalando os olhos quando ouviu algo sobre saber segurar uma vara.

Ethan estendia a ela uma vara de pescar, a olhando tão tranquilamente, que Alicia quis enterrar a cabeça em algum lugar com tanta vergonha de tudo que estava pensando sobre ele. Com certeza, aquilo era tudo fruto de sua imaginação fértil e depravada. “Você sabe que não é verdade... Só ver o jeito que ele te olha...” Segurou a vara de pescar, expressando um sorriso tímido. – Não muito, mas estou disposta a tentar. – “Você quer é segurar outra coisa...” Ela engoliu em seco, encarando o lago, já sentindo uma gota de suor escorrer pela sua nuca. “Vai lá, tira a prova! Ele está tão doido quanto você...” Alicia olhou para Ethan discretamente, enquanto ele prendia as iscas nos anzóis, e pegou a garrafa de água, fingindo tomar o líquido devagar. Como se fosse um acidente, deixou cair água por onde antes caíra o patê, molhando um pouco a blusa e a deixando meio transparente, onde agora dava para ver totalmente o contorno do sutiã e um pouco do tecido colado na pele de seu seio. – Meu Merlim, como eu estou desastrada hoje! – Fingiu surpresa e olhou para Ethan, com um sorrisinho sem graça.

E ali estava aquele mesmo brilho que ela vira nos olhos dele alguns instantes antes, uma faísca de desejo. “Você quer...” Alicia guardou a garrafa devagar, umedeceu os lábios e maquinou em sua cabeça uma forma lógica de não ser a primeira a tomar a iniciativa, mas, mesmo assim, conseguir o que estava querendo. Ela era uma garota muito inteligente, seja para o bem ou para o mal. – Eth... – Voltou a encará-lo, mas, agora, com um olhar ingênuo de uma donzela em apuros. – Estou com medo de fazer algo errado e acabar dentro do lago. – Sua voz soava melodiosa, como ela sempre imaginara ser a voz das mocinhas dos livros trouxas que ela sempre lera. – Você pode me ajudar? Porque, se você ficar aqui mais perto, eu vou me sentir mais segura. Por favor... – Ajeitou o cabelo atrás da orelha e abaixou os olhos, voltando a olhá-lo com um leve sorriso, ao mesmo tempo em que se arrastava mais para o lado, deixando um espaço no lugar que ocupava. Um espaço bem pequeno que só caberia duas pessoas ali se sentassem grudadas.

Rindo da reação de surpresa de Alicia, - algo que o garoto esperava acontecer devido o duplo sentido em suas palavras diante de tamanhã tensão sexual - apenas assentiu com o que a mesma acrescentou quando percebeu ao que ele se referia. Enquanto ajeitava as iscas na ponta de cada anzol, novamente o sonserino viu-se preso em uma nova emboscada, quando a amiga derramara água acidentalmente em sua camisa que por sua vez, revelava transparência a ponto de ficar nítido a marcação do sutiã. Àquela altura provavelmente já não havia restado nem mais uma gota de água na garrafa da garota que pudesse matar a sua sede ou sequer a vontade indomável que sentia de avançar nela, quebrando todas as normas de amizade e até mesmo de civilização. Era impossível manter a expressão normal ou sequer conseguir se recompor com a mesma habilidade de sempre por de tamanhã judiação.

Então, quando buscava a palavra certa que o fizesse parecer menos pateta diante da situação, Ethan começava a se dar conta de que a sonserina não estava ali pra brincadeiras. Quase como se juntasse todas as peças de um complexo quebra-cabeças, constatou não estar inventando coisas em sua mente e era tão óbvio como dois e dois são quatro que ambos queriam a mesma coisa. A expectativa cresceu. A medida que percebia uma encenação cada vez mais explícita, decidia-se entrar no jogo e não prolongar ainda mais o inevitável. ''Por que perder tanto tempo?'' Pensou desejando poder pular tudo aquilo e chegar direto nos finalmentes. — Se você perceber algo puxar mais forte do que possa aguentar, não exite em largar a vara. De qualquer forma, estarei bem ao seu lado pra te segurar. — Explicou tomando a liberdade de ocupar o pequeno espaço reservado pela mesma.

A expectativa mais a estática entre ambos ali lado a lado, colados daquele jeito era suficiente para que o bruxo mais uma vez sentisse seu corpo reagir, tornando quase impossível controlar-se. Enfim, aliviado ficou por não estar de pé de modo que revelasse qualquer protuberância, o garoto começaria a explicar o que fazer quando intencionalmente permitiu-se a distração, Olhando de um jeito nada sutil o pescoço a mostra de Alicia, quase como um vampiro sedento dos contos que desejava alimentar-se. — Isso é essência de frésia? — Perguntou cínico aproveitando a curta distância para quase enfiar seu rosto entre os cabelos e o pescoço da dela, permitindo-se soltar de leve a respiração abafada ali entendendo bem o sentimento que provocaria. ''Eu também sei brincar, Alicia!''

Sorriu involuntário afastando seu cabelo pra trás. — Não sei se já te disse alguma vez, mas eu realmente adoro esse cheiro. — Assumiu antes de roçar de leve os seus lábios na pela amostra, fechando instintivamente os olhos, se deliciando daquele pequeno momento. — Mas algo me diz que você já sabia disso. Caso contrário, não teria se preocupado em usar esse perfume. — Murmurou mudando sua expressão para algo mais sério, mantendo sua mão na nuca de Alicia de maneira que o polegar chegasse ao rosto, como se o segurasse. Encarou-a então profundamente por longos segundos aproveitando o silêncio pra calcular melho o seu próximo passo. Aproximando-se lentamente do rosto da mesma, mantendo apenas a distância de aproximadamente uns dez centímetros.